quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Sangue fresco: o desabafo de um vampiro

Sangue fresco. Aprecio bastante o sangue dos homossexuais. O gemido deles ao sentirem meus caninos é bem mais excitante. E o líquido vermelho é muito mais doce. As histórias e boatos sobre vampiros são as mesmas; só mudam de lugar.

Sou diferente. Discreto como um psicopata ou um político brasileiro. Quando abocanho, é pra valer. Mas ninguém nota. E se o fizer, ‘dou notas’.

Sou bem-sucedido, é. Tenho uma rede de livrarias e já li de tudo sobre mim. Sobre vampiros e toda essa mitologia em torno de águas-bentas, alhos, estacas e Van Helsing – que é um filme muito bom, inclusive.

Os livros sugerem onde nasci. Os escritores mais arfantes, onde me criei, me formei, me revelei. Me submeti. Acabo de limpar a boca com minha camisa Polo branca. Ela está vermelha na borda da frente, porque me submeti ao meu destino. Sucumbi a ele. Sou da linhagem de Judas Iscariotes.

(Ao contrário do que foi ensinado a todo mundo, Judas não era um traidor. E não morreu. No Evangelho de Mateus, ele ‘trocou’ Jesus por 30 moedas e depois se enforcou. Conversa! Já no livro Atos dos Apóstolos – tudo isso no Novo Testamento, ok, pseudo-católicos? –, Judas, com o dinheiro ganho após entregar o filho do Homem para ir para a cruz, comprou um terreno e lá foi morar. Há quem diga que ele foi pelas bandas do Egito. E para provar que ele não se matou nem traiu ninguém, foi descoberto, em 1978, um rosário de papiros – 13 no total – que constam os ensinamentos do maior traidor da História injustiçado: “O Evangelho de Judas”, em uma caverna... no Egito. E para se ter um evangelho, era preciso ter... seguidores. Ele sabia dos planos de Jesus e o ajudou. Cristo então ressuscitou, mas de nada veio a adiantar. O mundo é uma beleza; o que estraga são essas pessoas que botam culpa no Diabo quando pecam.)

Bem, sou da linhagem de Judas. Estou dizendo... Chupo o sangue dos covardes e dos traidores – uma forma de ‘recompensar’ a má fama de meu antepassado judeu. Minha família era judia e fugiu para o Brasil à época da 2ª Guerra Mundial. Nos escondemos onde ninguém iria procurar um: no estado de Alagoas. A Terra dos Marechais.

Na verdade, eu ainda não tinha nascido. Minha mãe, Debra, me teve em Arapiraca, cidadezinha do interior. Hoje estou com 31 anos e pude ver o Brasil ser pentacampeão. Vou morreu aos 33, como Jesus – é a sina de todo vampiro da minha classe. (Nós nunca fomos imortais e não somos necessariamente da Transilvânia. Esqueça Bram Stoker e feche as janelas.) Mas a vida não é tão ruim. Eu não me alimento só de sangue. Então, brindemos com taças vermelhas!

Quem tenho em meus braços, é Amy, minha secretária que ninguém sabe que é travesti – por isso que disse que gostava de ‘sangue fresco’. Eu não julgo as pessoas. Só sei quem elas são. Isso se eu chupá-las bem. (Inclusive, eu adoro mulher na TPM!) Tenho o dom da iluminação pela genética, digamos.

Quando mordo alguém, tudo passa pela minha cabeça; todos os eventos daquela vítima, os vividos e os que ainda virão. Não, eu não as mato mais. Desde o ano de 2000 não o faço. O fator determinante sempre foi a quantidade de sangue sugado. As pessoas morrem porque perdem muito sangue – e não por causa da mordida em si. Escovo os meus dentes...

Minhas vítimas viram minhas testemunhas; acabam por se tornar minhas comparsas. Foi assim que me dei bem na vida. É assim que ainda funciona.

Amy acorda assustada. Eu rio. Na boca, dentes bem delineados com um toque avermelhado. Ela estranha. Põe a mão no pescoço – no lado esquerdo – e nada. Sente uma dor psicológica.

Eu, na prática, mordo o braço. (Que o melhor lugar pra ‘coletar’ sangue senão o pulso?!) Dessa forma, roubei tudo dela – tudo o que não pode ser tomado por nenhum assaltante-que-rouba-por-duas-pedrinhas-de-crack. Levo comigo todo o conhecimento de Amy; e seu segredo mais bem guardado na calcinha. Sei de todos os medos dela, desejos, fetiches, decepções, sonhos e toda a breguice por trás disso. Mas ninguém, de todas as pessoas que eu já mordi, tem medo de vampiros...

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