segunda-feira, 26 de abril de 2010

Pedofolia

Idade das Trevas. Eis um período intrigante de nossa História que não poderemos apagar dos livros. Apagadas foram as fogueiras com o banho de água fria dos iluministas. E ainda bem que Nietzsche e seus aforismos não tinham nascido, senão a fogueira consumiria o calor de seus escritos e de sua ousadia autêntica.

Em seu livro O Anticristo, Nietzsche acusa a Igreja Católica de ser falaz e de hipócrita. De fato. A Idade das Trevas claramente foi uma época em que as indulgências eram a moeda e a certeza de um lugar no céu — mesmo se fossem poucos metros quadrados. A personagem protagonista dessa história é Martinho Lutero. Suas 95 teses pregadas na igreja de Wittenberg eram a prova de que algo estava errado.

Com o advento da comunicação impressa, graças a Gutemberg, Lutero foi capaz de espalhar sua ideologia por toda a Alemanha, no qual mostrava a verdadeira face da Igreja Católica. A população na época não tinha acesso a livros (só os nobres eram alfabetizados); é bem verdade que a Igreja “guardava” os livros para controlar os pensamentos do senso comum — o Índex que o diga.

Sem mais delongas, não dava pra guardar mais um segredo desses: pedofilia. Isso existe em todo canto, certo. Mas a Igreja, como instituição responsável pela vida e pela alma de milhares de fiéis convictos e cientes da santidade dos padres, que por sua vez tratam-se de uma espécie de ponte entre Deus e os homens comuns-mortais-pecadores, não pode, não pode, não poderá levar em frente o celibato.

A questão também envolve esse tópico. O homem é instinto. É animal puro. Não se pode tirar o desejo de dentro desses padres, gente! Padre casado já! Ele dará conta da Igreja e da sua casa, sem dúvidas. A Igreja parece que ainda vive na Idade das Trevas — viu aí leitor que o começo tinha sentido?

Homossexualismo: isso sim é que teria de ser discutido. Em Arapiraca, com o escândalo de pedofolia que ganhou notoriedade a nível internacional, a coisa ficou feia. Monsenhores Luiz Marques e Raimundo e padre Edílson foram desmascarados. Ser gay é normal. Mas não para o catolicismo, a raça ariana das religiões.

Intrigante mesmo é ver os fiéis aprendendo posições novas com os padres. Dona Deise, com seus mais de 80 anos, viu o vídeo de monsenhor Luiz Marques fazendo sexo com um ex-coroinha. Um 69 lateral. Só assim ela acreditou.

— Tá vendo agora, mamãe, o que é sexo oral?!
— E é isso, é? — perguntou ela, ingênua. — Pensei que esse sexo era na “hora” que o marido quisesse — disse ela, apontando para o relógio do punho esquerdo.

Então sexo anal seria “de ano em ano”? Não sei. Só sei que o vídeo não é montagem.
— É montagem, sim!
— Ora, montagem... só se for um montando no outro e falando: “Pega aqui no meu ‘baixo clero’, vem!”.

Mas os padres negam: “Eu nunca dei, não dou, não darei e nunca mais vou dar de novo”. Que bom! Sinal de que os tempos avançam e Igreja continua sendo honesta. E colocando a boca onde não é chamada.

quinta-feira, 22 de abril de 2010

Um caso insolúvel

Quando se fala em detetive, já se vem à mente figuras memoráveis como o impressionante Sherlock Holmes, de Sir Doyle, o inspetor Dupin, de Poe, o comissário Maigret, de Simenon, o simples Philip Marlowe, de Raymond Chandler, e o imoral e tarado Nick Belane, de Bukowski. Este nosso aspirante a detetive, na verdade, nossa, a jovem Anali Rolin, era tão detalhista e simpática quanto os anteriores.


Ela entrou para a carreira policial a contragosto dos pais. Jorge Rolin era um advogado renomado na pequena cidade de Passos, no interior de São Diogo. Queria que a filha colocasse os bandidos na cadeia do mesmo jeito que ele e não desta forma. Não suportava o fato de Anali ser uma mulher feita e tomar decisões. O machismo já não cabe mais nesses tempos.


Digamos que ela era uma espécie de estagiária-detetive. Só após resolver seu primeiro crime na prática é que seria chamada para trabalhar, de fato, na empresa Casos & Casos. Evidentemente, ela teria acompanhamento de seu superior: o comissário Cunha. Em seu currículo, um vasto repertório de serial killers e padres pedófilos pegos.


— Anali, tenho um caso pra você. Quem sabe, o primeiro de muitos — disse o comissário.

— Tomara, senhor. Eu já estava cansada de ir ao Instituto Médico Legal esperar os corpos e acompanhar a perícia. No mais, sempre perguntava o porquê das avaliações feitas e aprendi muita coisa. Pelo menos, o suficiente.

— Que bom! É sinal de que você amadureceu muito nesses seis meses conosco. A Anali que eu conheci era uma menina sem chão; hoje, vejo que você sabe bem aonde quer chegar.

— Quero trabalhar para o senhor — completou ela, secamente.

— Querida, você pode trabalhar comigo, quanto mais para mim — riu.


Anali pegou os papéis que estavam beirando a mesa e deu uma rápida olhadela no caso. E arrotou um “esse é fácil!”. Cunha ficou encantado com a frieza dela. Era de admirar que uma moça, com trejeitos de menina da cidade grande e rosto de maçã recém-colhida, fosse levar tão naturalmente a morte de dois irmãos gêmeos, enterrados no quintal de casa.


Eles foram à casa dos tais gêmeos na mesma hora. A mãe estava chorando na cozinha, tomando um copo d’água dado por um dos homens do Cunha. Ela soluçava que o marido tinha fugido depois do incidente. Depois disse que ele, antes de partir, cavou o chão do quintal pra simbolicamente enterrar os filhos desaparecidos há três semanas.


— Meu marido... ele comprou dois... caixões bem pequeni...ninos, porque a gente não... tinha notícias dos nossos bebês. Eu nunca... perdi minhas esperanças de eles estarem vivos. Mas... meu marido enlouqueceu — afirmou.


Cunha olhou pra Anali, concentrada no depoimento da pobre mãe. Quando ele tirou os olhos dela, foi sua vez de olhar para o comissário. Ele também desconfiava de algo muito estranho. O casal era novo na cidade e tinha acabado de se tornar pais. Ela o chamou para o canto.


— Não sei, mas mulher tem instinto, sabe?! Acho que já sei quem matou as crianças. Só preciso ver a disposição dos corpos. Vamos lá no quintal!

— Você na frente — inferiu Cunha, impressionado com a sagacidade de sua futura detetive.


[Continua]

domingo, 18 de abril de 2010

As sem-razões do amor


Eu te amo porque te amo.
Não precisas ser amante,
E nem sempre sabes sê-lo.
Eu te amo porque te amo.
Amor é estado de graça
E com amor não se paga.

Amor é dado de graça
É semeado no vento,
Na cachoeira, no eclipse.
Amor foge a dicionários
E a regulamentos vários.

Eu te amo porque não amo
Bastante ou demais a mim.
Porque amor não se troca,
Não se conjuga nem se ama.
Porque amor é amor a nada,
Feliz e forte em si mesmo.

Amor é primo da morte,
E da morte vencedor,
Por mais que o matem (e matam)
A cada instante de amor.

(Carlos Drummond de Andrade)

sexta-feira, 9 de abril de 2010

Os amantes

Tudo combinado. Tudo acertado. Tudo nos conformes. Às 15h, no Motel Doce Clitóris. Não tem erro... É ali pertinho do supermercado. E foi por conta deste detalhe, que a sagaz Bárbara combinou de ir ao tal motel com Ricardo, no qual intrinsecamente já tem nome de amante.


No entanto, ele não poderia ser um “Ricardão” legítimo, afinal, não era corpulento. Tinha uns braços notáveis aqui, umas pernas bem torneadas ali, mas nada passando dos 1,68m de estatura. Ricardo era um marido fiel — quando estava com a mulher — e um pai responsável.


“Painho, fiz uma prova de inglês esselente”, disse seu filho, Bruninho, pelo MSN. O pai, sempre atento, perguntou do computador do escritório de advocacia: “Que bom, meu filho! E a de português?”.


Já Bárbara era uma mulher solteira. Mulher independente. Mulher pós-moderna. Mulher “guerreira”, de fato. Seu affair mais empolgante era Ricardo. Mas existem coisas que os homens detestam: uma que eu lembro agora é frescura. Esse era o motivo pelo qual Ricardo não trocava a esposa, Karolina, por ela.


Bárbara era do tipo que vive em show de pagode e de axé, apesar de sua já avançada idade (32 anos na cara e 25 de corpo). Deixe-me deixar claro, leitor-que-lê: ela era daquelas que tinham uma simples cólica e ia ao médico, veja só você! O médico advertia: “Você não pode ingerir nenhuma comida carregada, a exemplo de lasanha, feijoada, buchada e lingüiça/calabresa”.


É verdade... Houve até uma vez que Ricardo chegou com um salgadinho de presunto na mão, oferecendo a ela e Bárbara: “Não, tô com cólica!”. Ricardo só balançava a cabeça e não entendia o porquê daquilo, justamente porque não havia sentido. “Esses salgadinhos são de milho, ora”, pensava ele. Mas deixa pra lá.


Voltando para o início do texto, já estava até esquecido. O Motel Doce Clitóris ficava do lado do supermercado Hiper Bompreço perto do trabalho dos dois. Ele desligou o telefone do escritório e foi direto para o supermercado. Isso mesmo. Os dois deixavam ambos os carros lá pra que, se algum conhecido os visse, dissessem que estavam apenas fazendo algumas comprinhas.


Tática infalível. O carro no estacionamento do Hiper seria o álibi perfeito. Se encontraram no motel. Do supermercado, pegaram táxis separados e entraram no paraíso. Chega até a ser jocoso o modo como eles encaravam tudo isso. “Cheguei primeiro!”, ria Bárbara.


— Quero tomar banho de banheira com você hoje! — exclamou ela.

— Na verdade, temo que este seja nosso último “passeio” juntos. Quero me dedicar à família e ao trabalho. Vivo sempre cansado...

— Ok — inferiu Bárbara, num tom de indiferença que chegou a surpreender Ricardo.


No banheiro, os dois devidamente desnudos, brindam uma taça da champagne da casa. Bárbara acende um cigarro e entra na cheirosa água espumada. Ricardo, ainda em pé e fora da banheira, vem logo em seguida. Mas em um movimento impulsivo, a amante joga a taça na altura do púbis do rapaz.


É quase um pecado jogar fora um Heidsieck & Co Monopole, feito na França. Digo isso não somente porque ele tem 200ml, mas pelo sabor bem equilibrado que uvas Chardonnay e Pinot Noir dão ao espumante. Ele deve ser servido a uma temperatura de 6ºC, contudo, neste instante, o púbis de Ricardo estava pegando fogo.


Bárbara jogara o cigarro em cima dele nos 12% de teor alcoólico, que agora jaziam no pênis de Ricardo, e o empurrou no chão. Ela saiu do quarto de motel em menos de 10 segundos. Esse foi o tempo de ele se levantar rapidamente e se aliviar na banheira. “Ahhhhh!”, suspirou ele, pegando os 100ml restantes de sua taça.


Deu um trago só. E disse em alto e bom sopro: “Eu mereci!”, analisando seu filho ruborizado e perguntou: “Tudo bem aí embaixo?!”. Ainda finalizou com uma piadinha: “É, o Doce Clitóris agora tá com cheiro de pentelho queimado” e foi se vestir para voltar ao supermercado e pro trabalho.