quarta-feira, 14 de outubro de 2009

O chip

Zeca, como era chamado por todos, gostava de brincar de boneca. A Barbie era sua predileta. Adorava fazer cenas calientes entre o Max Steel e ela. Quando cresceu, não era de se duvidar: virou um pegador. Qualquer garota que ele quisesse, conseguia. Seus amigos ficavam estupefatos e de queixo beirando o chão.


— Quando eu nascer de novo, quero ser pelo menos um terço do que você é — declarou Pedro, trocando o chip do celular de Zeca. Ao realizar a tarefa, ele falava com Zeca e, sem querer, deixou cair o chip azulzinho.

— Que nada, meu irmão. Eu sou normal. Eu só não dou bola pra todas. É essa a graça!

— Então o truque é rejeitar as gurias?

— Rejeitar é uma palavra forte. Eu diria “não dar corda”, entende?


Pedro ficou encucado. “Não é tão simples assim”, pensou ele. Ele era mais romântico e não entendia muito dos trejeitos do amor. Havia sido corneado umas quatro vezes — até onde ele sabia. Não tinha lógica alguma em amar outra pessoa. “Ninguém consegue ser monogâmico mesmo”, consolou Zeca, quando Pedro soube de sua última desventura. O outro logo tirou Pedro de seus devaneios:


— Rapaz, tenho um monte de telefone de meninas aqui no meu celular... Epa, mas não é nesse chip. Pedro, cadê meu chip?

— Caralho, acho que derrubei por aí — disse ele com ar de pesar. — Mas não se preocupe! Eu te dou outro.

— Você não compreende, vei. Aquele chip era o que eu representava pra você. Eu tinha todos os meus contatos ali!

— Use o Orkut ou o MSN, ora. Me desculpe!


Não adiantava. Zeca ficou duas semanas sem brincar de tiroliro na chulapa. (Se é que o leitor me entende...) Ele tinha o contato das meninas por outros meios. Porém seu celular, ou melhor, seu chip era tudo. Não adiantava. Era um novo tipo de síndrome do pânico. Pedro já tava pensando em fazer psicoterapia com ele. A cada dia que se passava, os ataques de pânico eram esporádicos, cada vez mais intensos e recorrentes.


O motivo? Qualquer mulher que passasse na rua — olhe você que ironia infame —, que olhasse pra ele, que tocasse nele... Zeca simplesmente sentia o perigo iminente cada vez que cruzava o olhar em alguma filha de Eva. Dessa forma, ficou trancado dentro de casa, durante os próximos anos de sua vida. Não havia analista que desse jeito.


De oitiva, alguns arriscavam que ele morrera ao lado do chip novo que Pedro outrora teria lhe devolvido; outros diziam que voltou a brincar de boneca Barbie. (Mas dessa vez sem o Max Steel.) E envelheceu como um vinho que não conseguiu fermentar. Morreu solteiro. No funeral, Pedro chorava muito ao colocar o chip azul no peito sem ar do velho amigo ex-garanhão. Em redor, todas as mulheres que um dia foram dele.

5 comentários:

  1. "Adorava fazer cenas calientes entre o Max Steel e ela."

    kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk

    Você é ótimo!

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  2. Muito legal seu texto... Vc tem uma capacidade narrativa muito boa e isso é essencial para quem quer escrever. Continue assim e vc irá longe, pode ter certeza. Um abraço!!!

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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  4. Final triste...
    ele bem que poderia substituir o chip azulzinho dele, por um verde...
    deixar de ser frouxo e rocomeçar, uma nova lista de contatos. Bixo leso... morreu sem furunfá! kkkkkkkkk

    muito criativo o texto.
    Tu escreve bem... já da pra escrever um best-seller.

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